Regulação de Stablecoins no Brasil: Equilibrando Inovação e Controle no Cenário Pós-2025
Data: 17 de dezembro de 2025
O mercado de criptoativos no Brasil, em constante ebulição, continua a ser palco de importantes debates regulatórios. Uma das discussões mais proeminentes, que ganhou novos contornos e cujos impactos se tornam mais evidentes em 2025, gira em torno da classificação de certas transferências de stablecoins como operações de câmbio pelo Banco Central do Brasil (BCB). Essa abordagem, que visa trazer clareza e controle a um segmento de rápido crescimento, reacende questões cruciais sobre inovação, investimentos e a posição estratégica do país na economia digital global.
As stablecoins, moedas digitais projetadas para manter um valor estável em relação a um ativo de referência – geralmente uma moeda fiduciária como o dólar americano ou o próprio real –, consolidaram-se como um pilar fundamental do ecossistema cripto. No Brasil, sua relevância é inegável, com estimativas que as colocam como protagonistas em uma parcela significativa das transações com ativos digitais. É nesse contexto de vasta utilização que o regulador busca estabelecer balizas, mas não sem gerar apreensão e um chamado por um diálogo mais aprofundado com a indústria.
O Cenário Regulatório Atual e a Classificação do Banco Central
A evolução do arcabouço regulatório brasileiro para criptoativos tem sido um processo dinâmico. A Lei nº 14.478, de 2022, que estabeleceu diretrizes para a prestação de serviços de ativos virtuais, foi um marco, designando o Banco Central como o principal regulador para as operações de conversão de ativos virtuais em moeda fiduciária e vice-versa, e para a custódia e transferência desses ativos.
A Lei 14.478/2022 e o Papel do BCB
Desde a promulgação da Lei 14.478/2022, o Banco Central tem trabalhado na regulamentação infralegal, buscando adaptar as normas existentes à realidade dos ativos digitais. Em 2025, grande parte dessas diretrizes já está em vigor, moldando a forma como as empresas e os usuários interagem com o mercado cripto. O papel do BCB, portanto, transcende a mera supervisão, estendendo-se à interpretação e classificação de novas modalidades de transação que surgem com a tecnologia blockchain. A premissa é clara: garantir a estabilidade financeira, prevenir a lavagem de dinheiro e proteger os consumidores.
A Interpretação das Stablecoins como Câmbio
A decisão do Banco Central de enquadrar determinadas transferências de stablecoins como operações de câmbio baseia-se na percepção de que esses ativos estão sendo frequentemente utilizados como substitutos de contratos cambiais tradicionais. Seja para facilitar importações, realizar pagamentos internacionais, ou para operar em corretoras estrangeiras, a agilidade e a menor burocracia das stablecoins as tornaram uma alternativa atraente. O regulador observa que, em um volume expressivo de transações, a finalidade econômica se assemelha à de uma operação de câmbio, justificando, assim, a aplicação de regras análogas.
Contudo, essa generalização é o cerne da discussão. Para muitos especialistas da indústria, essa perspectiva, embora baseada em um comportamento majoritário, não abrange a complexidade e a diversidade de usos das stablecoins. Em 2025, com a maturação do mercado, é ainda mais evidente que stablecoins servem a propósitos variados, desde a autocustódia e a proteção de valor contra a inflação, até investimentos em finanças descentralizadas (DeFi) e pagamentos domésticos entre pares. A uniformização regulatória, nesse sentido, pode gerar distorções e criar um ambiente de incerteza jurídica.
Impactos e Preocupações da Indústria
A indústria de ativos digitais no Brasil, embora reconheça a necessidade de um ambiente regulado, expressa preocupações significativas quanto à forma como essa regulação está sendo implementada, especialmente no que tange às stablecoins. A falta de um diálogo mais construtivo e a potencial sobrecarga tributária são pontos de atrito.
Inovação sob Risco: O Dilema da Generalização
Uma das maiores apreensões reside na dificuldade prática de diferenciar, no dia a dia, a finalidade exata de cada transação com stablecoins. Como distinguir uma operação de investimento de um pagamento internacional ou de uma simples transferência para autocustódia? Essa limitação técnica pode levar a uma aplicação indiscriminada de regras, penalizando usos legítimos e inovadores. A consequência direta é a criação de um ambiente de insegurança jurídica, que pode sufocar o desenvolvimento de novas soluções e modelos de negócio baseados em blockchain no país.
Empresas e startups que dependem da flexibilidade e eficiência das stablecoins para inovar podem ser forçadas a reconsiderar sua estratégia no Brasil. O risco é que o país se torne menos atraente para o capital de risco e para o desenvolvimento de talentos, levando à "fuga de cérebros" e de investimentos para jurisdições com arcabouços regulatórios mais claros e adaptados às particularidades da tecnologia.
O Fardo Tributário: IOF e a Dupla Tributação
A possibilidade de incidência do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as transações com stablecoins é outro ponto de grande preocupação. O IOF, tradicionalmente aplicado a operações de câmbio, crédito, seguro e títulos e valores mobiliários, adicionaria uma camada de custo que, segundo especialistas, poderia resultar em dupla ou até tripla tributação. Isso porque os recursos utilizados para adquirir stablecoins geralmente já foram tributados em sua origem, seja como renda ou como capital.
A imposição de IOF na entrada e na saída de um mesmo recurso, ou em diferentes etapas de uma operação com stablecoins, é vista como economicamente ineficiente e desestimulante. Tal medida poderia, paradoxalmente, empurrar as operações para a informalidade, dificultando a fiscalização e a arrecadação, e estimulando a criação de mercados paralelos, o que vai na contramão dos objetivos regulatórios de transparência e controle.
Competitividade Internacional e Fuga de Talentos
Em um cenário global onde jurisdições como a União Europeia, com o regulamento MiCA (Markets in Crypto-Assets), já estabeleceram frameworks abrangentes e relativamente claros para ativos digitais, o Brasil corre o risco de ficar para trás. A ausência de um modelo regulatório que equilibre controle e fomento à inovação pode impactar negativamente a competitividade do país. Startups e empresas consolidadas podem optar por se estabelecer em mercados com regras mais previsíveis e favoráveis, levando à perda de investimentos, de mão de obra qualificada e de protagonismo tecnológico para o Brasil.
Perspectivas e Soluções para um Futuro Equilibrado
Apesar dos desafios, a indústria e o próprio regulador reconhecem a necessidade de encontrar um caminho que harmonize a segurança jurídica com o potencial transformador das stablecoins e da tecnologia blockchain.
Diálogo e Colaboração: A Chave para um Ambiente Robusto
A construção de um modelo regulatório eficiente e alinhado à realidade tecnológica exige, fundamentalmente, um diálogo mais estreito e colaborativo entre o Banco Central e os representantes do setor. A experiência de outras jurisdições demonstra que a cocriação de normas, por meio de consultas públicas substanciais e grupos de trabalho conjuntos, resulta em regulamentações mais eficazes, menos onerosas e mais propícias à inovação. Em 2025, a maturidade do mercado cripto brasileiro já permite que esse diálogo seja ainda mais produtivo, com dados e experiências concretas para embasar as discussões.
Ferramentas Regulatórias Flexíveis: Sandboxes e Períodos de Transição
Ferramentas como os sandboxes regulatórios – ambientes controlados onde inovações podem ser testadas sob supervisão e com regras flexíveis – são cruciais. Eles permitem que reguladores e empresas aprendam juntos, identificando riscos e oportunidades antes da implementação de normas amplas. Períodos de transição bem definidos também são essenciais para que o mercado se adapte às novas regras sem interrupções abruptas ou custos proibitivos.
Sinergia entre Órgãos: BCB e Receita Federal
A coordenação entre o Banco Central e a Receita Federal é vital para evitar a sobreposição de regras e a tributação excessiva. Uma maior integração na coleta de dados e na formulação de políticas pode garantir que a tributação seja justa, eficiente e não desestimule a inovação. A clareza nas diretrizes fiscais é tão importante quanto a regulamentação operacional para o desenvolvimento saudável do mercado.
O Potencial Estratégico das Stablecoins Lastreadas em Real
Para além dos desafios regulatórios, as stablecoins, especialmente aquelas lastreadas no real brasileiro, representam uma oportunidade estratégica ímpar para o país.
Além do Câmbio: Inovação Financeira com o Real Digital
Em 2025, com o Real Digital (DREX) em fases avançadas de implementação ou já em circulação inicial, o potencial das stablecoins lastreadas no real ganha ainda mais relevância. Uma stablecoin de real bem regulamentada e interoperável com o DREX




